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Covid-19: “No epicentro europeu da pandemia”

Ricardo Pinto, diretor de uma consultora informática no setor bancário, viveu de perto trágica situação de Itália, em Milão, naquele que foi o epicentro europeu da epidemia, e, depois, na região italiana da Suíça. O aguiarense e luso-suíço fala das duas realidades, num texto publicado na nossa edição impressa de 11 de abril

“Embora as pessoas, no início, não tenham levado a sério a epidemia, o governo italiano teve a coragem de tomar medidas de contenção sem precedentes, que culminaram com o confinamento da região Lombardia no dia 8 de março e, alguns dias depois, com o encerramento dos aeroportos e fronteiras. As medidas impostas pelo governo chinês foram radicais e tornaram-se eficientes, mas é importante salientar que o tipo de governação local permite às autoridades tomar as decisões e ninguém as vai pôr em causa, mas, sim, obedecer (com pena de morte para os transgressores). Agora, quando eu falo da coragem do governo italiano é porque, hoje, o ocidente já conhece o significado da limitação de todos os direitos e liberdades, mas quando o primeiro ministro italiano o decretou esse estado foi, inicialmente, uma chuva de críticas pelos próprios cidadãos, que não tinham ainda conhecimento da gravidade da situação.

Foram os próprios cidadãos a tornarem a situação pior, desrespeitando as medidas do governo e fugindo de Milão para o sul do país, levando com eles o contágio. Em minha análise, a única culpa que se pode apontar ao governo foi que, embora tenha sido uma decisão radical e sem precedentes, deveria ter sido decretado o estado de emergência uma semana antes, no final de fevereiro. Isto porque de 1 a 8 de março foi uma situação híbrida, que não serviu para bloquear o contágio, com encerramento de atividades e serviços a conta gotas. Perderam-se duas semanas fundamentais para conter a propagação do vírus e o resto foi aquilo que todos acompanhamos nos meios de comunicação social.

Mas, é inaceitável que, nas últimas duas semanas, 120 mil pessoas tenham sido multadas por desrespeitarem a obrigação de confinamento e isolamento em casa. Agora há mais uma nova regra que obriga ao uso de máscara, ou outro utensílio que proteja a boca e o nariz, na rua e nos espaços públicos.

Apesar da dramática e grave situação em Itália, onde há mais de 91 mil infetados e já morreram perto de 16 mil pessoas, felizmente, até hoje, ninguém dos meus conhecidos italianos contraiu este vírus.

Já que a nível profissional todas as minhas atividades em Milão estavam a ficar condicionadas, no passado dia 7, regressei a Lugano, no sul da Suíça. A Suíça é uma confederação de estados com autonomia nas decisões sobre o território, em particular Lugano e o cantão do Ticino, que pela vizinhança com Itália têm uma situação particular, onde todos os dias entram e saem cerca de 70 mil italianos, que trabalham na Suíça. Desde logo, houve preocupação e foram tomadas medidas pelo governo do Ticino. Primeiro, recomendações sanitárias, mas logo, a 13 de março, o cantão decretou o estado de emergência, encerrando estabelecimentos de lazer e restauração e, uma semana depois, de todas as atividades privadas não necessárias, portanto, também as fábricas e a construção civil, e das fronteiras, havendo um controlo minucioso e deixando entrar quem comprovasse a necessidade.

Num espaço de uma semana, os contágios começaram a subir em toda a Suíça e todos os cantões replicaram as medidas do Ticino, embora inicialmente criticadas, foram exemplares no timing de aplicação.

Em termos de contágios e mortes, foram números importantes que continuam a crescer, embora de forma menos grave. O sistema sanitário reagiu bem, mas esteve no seu limite de cuidados intensivos desde a segunda semana. Atualmente, a Suíça ultrapassou já os 20 mil casos positivos e regista mais de 500 mortes.

Infelizmente, logo na primeira semana em que foi detetada a presença do vírus no Ticino, o pai de um amigo foi infetado, acabando por falecer. Era uma pessoa sem problemas de saúde e com menos de 70 anos. Também, dois casais de amigos foram contagiados, nos dois casos os maridos foram assintomáticos, enquanto as esposas passaram por uma forte gripe em casa, mas sem necessidades hospitalares.

A situação atual é ainda de confinamento obrigatório para a generalidade da população e apenas supermercados e farmácias estão abertos. As pessoas com mais de 65 anos estão impedidas de entrar nos supermercados e foi organizado um servido de entrega ao domicílio para lhe fazerem chegar as compras. E, só um membro por família pode entrar nos estabelecimentos comerciais, para evitar aglomerados.

As medidas estão confirmadas até dia 19 de abril, com um acompanhamento diário da evolução e, portanto, poderão se estender.

Toda esta realidade teve impacto, também, na minha atividade profissional. Coloquei todos os meus colaboradores a trabalhar a partir de casa, em modalidade de trabalho reduzido a 50%, com subsídio do governo. Com o teletrabalho conseguimos desenvolver algumas atividades, mas, se a situação não se normalizar até final de abril, terei de avaliar outras soluções. A nível pessoal, também estou confinado em casa desde do dia 18 de março, onde trabalho e estou com a minha companheira, saindo só para fazer compras e uma caminhada. No contacto social com a família, decidi seguir as recomendações e restringi as visitas à casa dos meus pais.

O percurso ainda será longo, mas, se todos formos fiéis às regras do momento, iremos passar para uma fase menos crítica, até atingirmos a normalidade, que espero que seja dentro de três meses.”

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